sábado, 27 de maio de 2017

História trágico-marítima (CCXVIII)


O encalhe da barca "Flor de S. Simão"

Sinistro marítimo
Ontem, às 10 horas e quarenta e cinco minutos da manhã, quando entrava a barra do rio Douro, a barca “Flor de S. Simão”, procedente de Pernambuco por Lisboa, com 48 dias de viagem, uma volta de mar fê-la bater nas pedras da Meia-Laranja.
Em resultado deste acidente abriu água com tal violência, que não obstante os esforços empregados para a salvar, às 4 horas da tarde estava rasa de água e completamente perdida a esperança do bom resultado daquelas diligências.
Vinha consignada ao sr. José Baptista Vieira da Cruz.
O carregamento consistia em sal, dois mil e tantos sacos de açúcar e outros géneros, de que se perdeu quase tudo. Salvaram-se apenas algumas sacas de açúcar, mas poucas. Consta que o casco e a carga estavam seguros em duas companhias desta cidade (Porto).
O navio pertence à praça de Pernambuco (?).
(In jornal “Comércio do Porto”, terça-feira, 29 de Agosto de 1871)

Desenho de uma barca, sem correspondência ao texto

Características disponíveis da barca “Flor de S. Simão”
Nº Oficial: N/a - Iic: H.C.G.P. - Porto de registo: Porto
Armador: Não identificado
Arqueação: 382,556 m3

Barca “Flor de S. Simão”
A barca “Flor de S. Simão” que ante-ontem naufragou próximo à barra, estava segura bem como o carregamento nas duas companhias Garantia e Segurança pela quantia de 32 contos, sendo metade do casco e metade do carregamento em cada uma delas.
A “Flor de S. Simão”, como foi dito, vinha de Pernambuco por Lisboa, de onde trazia 5 dias de viagem. O seu carregamento consistia em açúcar, algodão, couros e ourelo (ou ourela; fitas de pano grosso). O capitão é o sr. António de Salles e Silva.
Acerca das causas do naufrágio variam as opiniões. Segundo uns, o navio naufragou em consequência de lhe cair o vento sul pela proa, atirando-o sobre as pedras da Meia-Laranja. Segundo outros, o sinistro foi motivado pela corrente da maré, que enchia com muita força, levando o navio para junto daquele paredão, depois de o ter feito bater numa pedra desconhecida.
O que é certo, é que todos os esforços empregados pela tripulação para salvar o casco, de nada serviram. O rombo que o navio fez foi tão grande, que este encheu-se logo de água, não sendo possível estancá-la com as bombas.
Na noite de ante-ontem trabalharam muito, tendo sido conseguido tirarem para terra 150 sacos de açúcar e 15 de algodão, e alguns objectos do velame e massame, ainda que tudo alguma coisa avariado. Trabalham ainda para ver se salvam mais alguma carga.
O casco ainda se conserva inteiro sobre as pedras da Meia-Laranja, quase encostado ao paredão, que foi construído do lado da Cantareira.
Na ocasião do sinistro que sofreu a “Flor de S. Simão”, esteve também quase a virar-se uma lancha, que ia a entrar. Felizmente nada sofreu, por lhe acudirem as catraias que estavam próximas.
(In jornal “Comércio do Porto”, quarta-feira, 30 de Agosto de 1871)

Barca “Flor de S. Simão”
Tem continuado as diligências para salvar a maior porção que seja possível do carregamento da barca “Flor de S. Simão”, ultimamente naufragada à entrada da barra.
Até ontem conseguiram salvar 362 sacos com açúcar, 39 fardos de algodão, 8 fardos de ourelos, 9 barris e 7 caixas com vários géneros e uma porção de massame, correntes e outros utensílios de bordo.
(In jornal “Comércio do Porto”, quinta-feira, 31 de Agosto de 1871)

Barca “Flor de S. Simão”
Teve lugar ontem de manhã na Foz a arrematação do casco da barca “Flor de S. Simão”, ultimamente naufragada nas pedras da Meia-Laranja, bem como de todos os aprestos e o não visto da carga.
Foi tudo arrematado pelo sr. Júlio Schneider, de Cima do Muro, pela quantia de 4:205$000 réis. A arrematação foi feita por conta das duas companhias de seguros Garantia e Segurança. Parece que o sr. Schneider arrematou o casco para uma companhia de barqueiros, que projectam pô-lo a nado.
(In jornal “Comércio do Porto”, sexta-feira, 1 de Setembro de 1871)

Barca “Flor de S. Simão”
Tem continuado as diligências para salvar o casco e ainda alguma carga da barca “Flor de S. Simão”. Ante-ontem de tarde e à noite, e ontem pela manhã, por ordem do arrematante, o sr. Schneider, foi empregue um mergulhador para entrar no porão do naufragado navio, a fim de extrair a carga que estava ainda debaixo de água.
Efectivamente algum resultado foi alcançado através destes esforços, pois foram tiradas por esta forma algumas sacas de algodão e bastantes sacas de açúcar, mas estas quase vazias, em consequência de se ter dissolvido o açúcar na água.
Ontem principiaram os trabalhos para levantar o casco. Para esse fim foram postas em volta do navio muitas pipas, para formar jangadas, com as quais se pretende suspendê-lo, fazendo ao mesmo tempo esgotar a água entrada no casco, por meio de bombas estanca rios.
Com estes trabalhos é esperado que a barca fique hoje a nado.
(In jornal “Comércio do Porto”, sábado, 2 de Setembro de 1871)

“Flor de S. Simão”
A barca com este nome, depois de preparada, com pipas vazias no porão, e algumas amarradas no costado, foi, no Domingo, posta a nado no sítio da Meia-Laranja, onde se encontrava naufragada desde o dia 28 de Agosto.
Às 6 e meia da tarde, depois de tirada para o largo pelo vapor “Mendes Leal”, foi por este vapor rebocada até S. Paio, em frente do Ouro, onde ficou para dali ser levada até ao estaleiro de Gaia. Efectivamente, ontem às 5 horas da tarde, foi conduzida para aquele estaleiro a reboque do mesmo vapor.
Por esta ocasião foram lançados ao ar grande número de foguetes, com que os interessados festejaram o bom êxito das operações para a pôr a nado e conduzir para ali. Por enquanto ficou surta junto do estaleiro, devendo mais tarde ser colocada nele, a fim de ser concertada.
Diz-se que o rombo que a fez naufragar fôra feito pela máquina ou parte do casco do vapor de ferro “General Lee”, que há dois ou três anos se perdeu no sítio onde a barca naufragara.
O açúcar que fôra salvo da barca antes da arrematação do casco, foi no sábado arrematado na alfândega de Miragaia. Eram umas 250 sacas de açúcar em bom estado, e 600 de açúcar molhado de água salgada.
O branco, sem avaria, foi arrematado na razão de 2$000 réis por cada 15 kilos, e o mascavo na razão de 1$695 réis. O molhado foi arrematado a 700 réis por cada 15 kilos; tudo cativo dos direitos. Foi arrematante o sr. Manuel José Monteiro Guimarães, Em segunda arrematação por conta deste foi tudo arrematado, em globo, por 701$500 réis.
(In jornal “Comércio do Porto”, terça-feira, 5 de Setembro de 1871)

Anúncio da viagem que estava prevista, mas não concretizada

Barca “Flor de S. Simão”
Depois de arrematado o visto e o não visto da barca “Flor de S. Simão” o arrematante, sr. Schneider, ainda conseguiu tirar 1.189 sacas de açúcar avariado e um fardo de algodão. Tudo isto foi levado para a alfândega, por se achar cativo de direitos.
(In jornal “Comércio do Porto”, quarta-feira, 6 de Setembro de 1871)

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